Será inaugurada no dia 26 de outubro, na Torre do Olho do Museu Oscar Niemeyer (MON), a exposição do artista Poty Lazzarotto (1924 – 1998): “Poty, Entre Dois Mundos”, com obras inéditas. A curadoria é de Maria José Justino e a assistência de curadoria é de Juliane Fuganti.
A mostra é um recorte da maior coleção já doada à instituição, com aproximadamente 4,5 mil obras, e inicia no MON um espaço contínuo de exposições deste importante artista.
A doação, generosamente feita pelo irmão de Poty, João Lazzarotto, trouxe ao Museu mais de 3 mil desenhos e 366 gravuras, além de tapeçarias, entalhes, serigrafias e esculturas.
Na ocasião da doação, o irmão comentou que o gesto atendia ao desejo do artista. “Poty dizia que obra de arte é para o público olhar e queria que as suas ficassem aqui. Ele recusou pedidos de levar para Paris e para outros lugares. Curitiba era tudo para ele.” O irmão explicou que a família escolheu fazer a doação ao MON por ser um museu com as condições necessárias para abrigar, preservar e expor as obras.
“A partir de agora, um significativo recorte da Coleção Poty pode ser vista pelo público nesta mostra, que inicia no MON um espaço contínuo de exposições deste importante artista”, afirma a diretora-presidente do MON, Juliana Vosnika. Parte de suas obras também deverá ser levada ao interior do Estado, em mostras itinerantes, permitindo assim à instituição exercer sua importante função de democratizar a arte.
Para Luciana Casagrande Pereira, superintendente-geral da Cultura, “a incorporação da coleção de Poty ao acervo do MON é um marco porque é a garantia de que a grande e expressiva obra do artista torna-se definitivamente patrimônio dos paranaenses”.
A exposição
A mostra reúne aproximadamente 130 obras. Segundo a curadoria, o público tem nesta exposição a oportunidade de perscrutar um Poty ambivalente: a experiência mística e a transgressiva, a contemplação e os sentidos, o amor divino e o carnal narrados por belas imagens.
A temática do sagrado é apresentada com uma diversidade de técnicas: desenho, gravura ponta-seca, água-forte, água-tinta, litografia, xilogravura, escultura e mural. A exposição também traz ao público muitos desenhos, em boa parte inéditos, feitos pelo artista.
“Dono de um desenho primoroso e um gravador excepcional, Poty foi grande em muitos temas: o trabalhador (em especial, os ferroviários), a guerra, a cidade, a história (narrada, sobretudo, nos imensos murais a céu aberto), os indígenas (em 1967, Poty albergou-se no Parque Indígena do Xingu), os santos (em especial, São Francisco), as mulheres da família, as prostitutas e as cenas do cotidiano”, comenta Maria José. “Em todos, ele é ímpar”, diz a curadora.
Doação extraordinária que a família de Poty Lazzarotto generosamente entrega ao público, alojada no MON. São mais de 4.500 obras em diversas linguagens: desenho, gravura em metal – água-forte, água-tinta, ponta-seca –, xilogravura, litografia, serigrafia, entalhe e escultura, além de matrizes de gravuras. Dono de um desenho primoroso e um gravador excepcional, Poty foi grande em muitos temas: o trabalhador (em especial, os ferroviários), a guerra, a cidade, a história (narrada sobretudo nos imensos murais a céu aberto), os indígenas (em 1967, Poty albergou-se no Parque Indígena do Xingu), os santos (em especial, São Francisco), as mulheres da família, as prostitutas e as cenas do cotidiano. Em todos, ele é ímpar. O MON passa a ser uma espécie de repositório da coleção, com o compromisso de divulgá-la.
Neste primeiro momento em que se revela esse acervo ao público, optamos por uma pequena entrada no conjunto da coleção, dando uma ideia geral desse tesouro, no que tange tanto às técnicas quanto às temáticas. Apresentamos na sala do 1º andar uma introdução que busca dar conta do vultoso legado, com uma amostra das técnicas e dos temas. Em seguida, em outra sala (térreo), fizemos dois recortes que vagueiam entre o sagrado e o profano, instâncias que muitas vezes se cruzam. Nessa sala, no que concerne ao profano, o público terá uma entrada, por meio sobretudo de desenhos, em boa parte das obras ainda inéditas. Trata-se de uma profícua produção de Potynos anos 1960, mas que também aparece, em produção menor, em outros tempos e em outras técnicas.
Nas duas salas, temos tempos diferentes. Tempo “dividido em tempo profano e tempo sagrado, sendo o primeiro o tempo ordinário, o do trabalho e do respeito aos interditos, e o segundo, o tempo da festa, isto é, essencialmente o da transgressão aos interditos” (Caillois. In Bataille:166).
Poty é um nome fundamental na arte brasileira. Quem teve essa perspicaz percepção, muito antes dos historiadores da arte e dos críticos, foi o antropólogo Darcy Ribeiro ao afirmar: “Se o Paraná não produzir daqui pra frente nenhum artista mais, só com o Poty estará à frente de todas as outras províncias brasileiras”. Acertou em cheio. Criador de uma poética, ele inscreve uma assinatura singular na arte brasileira. Seus traços são inconfundíveis. Potyé único.
Sua obra deixa entrever a admiração pela alemã Käthe Kollwitz, além do cinema expressionista alemão e do seu confessado amor por Daumier e Goya (“A Revolta” e “Desastres da Guerra”). Mas há um deslumbramento por Paolo Ucello, em especial pela obra “Batalha de São Romano”, que ensina a Poty a desordem criativa. De resto, Poty é um artista de estirpe, raro, sensível, culto e de seu tempo, surpreendente tanto na arte como na teoria. Seu amor por Goya e Kollwitz guarda o encanto pelo povo. Não era filiado ao Partido Comunista, mas tinha com os socialistas uma identidade na temática popular e no interesse de que a arte se estendesse a todos. “Fui seguindo desenhando meus operários sem me comprometer… não tenho temperamento para me submeter a disciplinas” (Poty). É a tendenciosidade autêntica no artista que só aumenta a qualidade da obra.
Poty era religioso? Como filho de italianos católicos, tem lá a sua parcela de religiosidade, mas não no sentido de um homem de Igreja. Mesmo porque Potyfaz parte de uma geração herdeira da industrialização que contribuiu para a dessacralização do cosmos. Mas permanecem em Poty vestígios do sagrado, atração pelo mistério do homem, uma vontade de comunicação com o transcendental. Creio que ele se aproxima da religião muito mais no entendimento de religare. A ligação ao outro, à natureza e, no caso de Poty, a sua sensibilidade pelos trabalhadores atestam essa empatia – ou religare.
O sagrado se faz presente em todo universo espiritual, em todo lugar em que a realidade transcende o mundo. O tempo moderno é o da dessacralização. “O homem moderno a-religioso assume uma existência trágica” (Eliade:165): viver sem Deus ou deuses, sem mitos, sem verdades eternas. O ser humano, crente ou não, está eivado do sagrado. Permanece em nós a presença do sagrado manifesto no inconsciente.
No plano erótico, Poty volta-se para a matéria bruta, o erotismo dos corpos. Inclina-se para o erotismo carnal de Courbet e Dalton Trevisan (“A Polaquinha”). A sexualidade é por ele tratada com rudeza, a realidade nua e crua. Nesses desenhos, Poty é direto, sem subterfúgios. Vemos as mulheres de Poty como objetos do desejo, sempre apresentadas com delicadeza; quanto ao homem, o tratamento é mordaz, mais violência do que força. Os nus de Poty revelam uma objetividade seca, sem romantismo, muitas vezes o sexo como mercadoria. Poty é um instaurador de carnes. Não há galhardia, ele é direto. É muito mais o sexo sem beleza ou o fascínio do sexo como verdade. Mas há em todos esses desenhos um tratamento formal, construtivo, a afirmação do erótico sobre o biológico. Poty não bane a natureza, do mesmo modo que abriga o espiritual. O corpo humano é templo e casa, habitação. Há uma sacralidade no ser humano.
O público tem nesta exposição a oportunidade de perscrutar um Poty ambivalente: a experiência mística e a transgressiva, a contemplação e os sentidos, o amor divino e o carnal narrados por belas imagens.
Maria José Justino
Exposição virtual
O MON está ao lado de grandes museus do Brasil e do mundo na plataforma Google Arts & Culture. Visite nossas exposições em formato virtual.
Conheça mais sobre esta exposição na plataforma Google Arts & Culture.